Unidade 2 – Vigilância Das Doenças Transmissíveis

As ações de vigilância em saúde relacionadas à dengue, zika e chikungunya dependem da situação epidemiológica local, do nível da infestação vetorial e da circulação viral.

A tendência de casos notificados por semana epidemiológica pode ser facilmente obtida nos bancos de dados e são de simples acompanhamento. A curva de casos pode ser comparada a curvas de anos anteriores, e o incremento semanal de notificações é um importante alerta para detecção de mudanças no padrão temporal.

Como as três arboviroses podem ser confundidas clinicamente ou ocorrer de forma simultânea no território, é necessário analisar, por meio da vigilância laboratorial, qual tem predominado. Além disso, como o vetor das três é o mesmo, é interessante elaborar curva única para visualizar áreas com maior transmissão e aumentar a sensibilidade para detecção de epidemias.

O sistema de informação que poderá auxiliar na análise laboratorial é o Gerenciador de Ambiente Laboratorial (GAL), que também complementa as análises de dados notificados no SINAN. Por meio dele é possível avaliar a taxa de positividade para cada uma dessas arboviroses. Esse sistema é alimentado pelos Laboratórios Centrais de Saúde Pública (LACENs) e pelas unidades de saúde que coletam as amostras.

Qualquer mudança de padrão na transmissão das arboviroses só será detectada se a vigilância for contínua. No entanto, em situações de epidemia, a realização dos exames específicos não deve ser direcionada para a confirmação da totalidade dos casos suspeitos. Ela deve ser usada para orientar a vigilância. A vigilância também deve ser flexível, para se adaptar à situação epidemiológica local.

Como já discutido neste módulo, é no município que a maioria das ações de vigilância precisa ser desenvolvida. O município é o responsável por alimentar o SINAN, a partir da notificação e investigação dos casos. Também é de responsabilidade do município a maioria das ações de controle ou prevenção.

Considerando o exposto, o guia de vigilância apresenta três cenários diferentes de transmissão de DCZ:

  • Município não infestado pelo Aedes aegypti;
  • Município infestado sem transmissão;
  • Município infestado com história prévia de transmissão.
  • Para cada um desses cenários, são previstas diferentes ações. Como a maior parte dos municípios do Brasil é infestada pelo Aedes aegypti, também há história prévia de transmissão. Vamos priorizar as ações previstas neste cenário, conforme descrito a seguir.

    2.4.3.1.1 Município infestado com história prévia de transmissão de dengue, chikungunya e/ou zika

    Nos municípios infestados pelo Aedes aegypti com histórico de transmissão, os principais objetivos da vigilância são detectar precocemente a circulação viral, identificar o vírus predominante e adotar medidas que reduzam a ocorrência de casos e, se possível, a duração da epidemia nos períodos epidêmicos (BRASIL, 2019a).

    Nos períodos não epidêmicos, a vigilância deve investigar e encerrar rapidamente os casos, identificar o agente etiológico e acompanhar oportunamente a curva de casos e qualquer mudança no padrão de ocorrência, para reduzir assim a ocorrência de epidemias ou preparar a assistência para evitar óbitos.

    É necessário manter diálogo permanente com as equipes de controle vetorial para sinalizar áreas de maior transmissão no território.

    Nos períodos não epidêmicos, a vigilância deve orientar a realização dos exames laboratoriais específicos, para que não haja sobrecarga dos laboratórios de saúde pública. As recomendações sobre a notificação compulsória são mantidas. O SINAN deve estar atualizado para permitir as análises oportunas com dados fidedignos.

    Importante

    Jamais deve-se aguardar a confirmação laboratorial dos casos para reconhecer a epidemia, direcionar medidas de controle e, muito menos, orientar a condução clínica dos casos.

    Com relação aos óbitos, eles devem ser notificados já quando houver suspeita e investigados o mais rápido possível, pois podem fundamentar adequações da assistência para evitar novos óbitos.

    O diagrama de controle é uma importante ferramenta da vigilância no monitoramento da situação epidemiológica e na determinação de epidemia. Uma vez detectada a epidemia, outras ações devem ser priorizadas. Veremos adiante como elaborar o diagrama de controle.

    Nos períodos epidêmicos, recomenda-se a implantação da sala de situação para permitir melhor diálogo entre todos os envolvidos na resposta à epidemia e que se priorize a realização dos exames específicos para determinados grupos, como crianças, gestantes, idosos, casos graves, atípicos e óbitos, evitando a sobrecarga dos laboratórios.

    Pode-se utilizar a confirmação por critério clínico-epidemiológico, desde que a identificação de vírus ou sorotipos predominantes esteja bem caracterizada, assim como o percentual de positividade das sorologias permita essa análise.

    Em momentos epidêmicos, sugere que seja feita a coleta de sangue de 1 a cada 10 pacientes (10%) com suspeita de dengue, aplicando-se a mesma proporção para zika e chikungunya. O monitoramento viral deve ser mantido, conforme rotina estabelecida (BRASIL,2019a).

    Alguns algoritmos para diagnóstico laboratorial de dengue, chikungunya e zika estão apresentados nas Figuras 11, 12 e 13. Nestas figuras, estão destacados o processo de coleta de amostras e registro no GAL, além do período adequado de coleta para cada exame.

    Figura 11 - Fluxo de amostras para diagnóstico de dengue
    Brasil (2021d, p. 709).
    Figura 12 - Fluxo de amostras para diagnóstico de CHIKUNGUNYA
    Brasil (2021d, p. 724).
    Figura 13 - Fluxo de amostras para diagnóstico de ZIKA
    Brasil (2021d, p. 749).

    Os óbitos devem ser, preferencialmente, confirmados por critério laboratorial e investigados oportunamente com os objetivos de identificar os possíveis determinantes e auxiliar na definição de estratégias para aprimoramento da assistência, evitando a ocorrência de novos óbitos. Devem ser investigados, preferencialmente, pela vigilância do próprio município.

    2.4.3.2 Febre amarela

    Vamos falar um pouquinho sobre a Febre amarela.

    Você sabe quais os objetivos da vigilância de febre amarela?

    O primeiro é detectar precocemente a circulação viral, preferencialmente enquanto ainda estiver ocorrendo o ciclo enzoótico (transmissão restrita a animais).

    Onde queremos chegar? Instituir oportunamente as medidas de prevenção e controle; reduzir o risco de transmissão da febre amarela silvestre e da febre amarela urbana para a população.

    A investigação deve ser iniciada imediatamente após a notificação de um ou mais casos suspeitos de febre amarela, para que possam ser adotadas medidas de controle em tempo oportuno.

    Saiba mais

    As variáveis essenciais para investigação estão contidas na Ficha de Investigação da Febre Amarela, que pode ser acessada por meio deste link: www.portalsinan.saude.gov.br/

    • O que devemos incluir na coleta de dados, a partir da identificação do paciente?

      • • Dados sobre a história e manifestações clínicas;
      • • Histórico de vacinação;
      • • Acompanhamento da evolução dos pacientes;
      • • Checagem dos resultados dos exames laboratoriais específicos.
    • Na história da transmissão deve-se buscar

      • • Identificar o local de transmissão;
      • • Verificar o histórico de deslocamento do caso, considerando o antecedente de 15 dias do início dos sintomas;
      • • Determinar a extensão da área de transmissão por meio de busca ativa de outros possíveis casos humanos.

    Por fim, coletar material de todos os casos identificados durante a investigação cabe à vigilância epidemiológica, e aos laboratórios centrais de saúde pública/laboratórios de referência. Nessa etapa é preciso viabilizar, orientar ou até mesmo realizar as coletas.

    Mas não podemos esquecer que as medidas de controle devem ser desencadeadas antes mesmo da confirmação laboratorial dos casos. Entre elas, é importante lembrar algo que você já viu em outras unidades.

    As epizootias em primatas não humanos (PNH) notificadas constituem um “evento de alerta do risco de transmissão silvestre de febre amarela”. Devem ser investigadas para caracterização dos planos de intervenção. Essas áreas serão definidas como afetadas, quando a transmissão for ativa, ou ampliadas, quando se tratar de áreas próximas.

    Lembrando que:

    Qualquer cidadão pode informar para as autoridades de saúde a morte de macacos. A investigação deve ser iniciada o mais rápido possível para determinação do LPI, intensidade da transmissão e área de abrangência do evento. A ficha de notificação e o relatório específico para investigação de epizootias pode ser consultado clicando aqui.

    As amostras para envio ao laboratório devem ser coletadas, de preferência, no próprio local onde o animal for encontrado, evitando o deslocamento de patógenos de uma área afetada para outra, supostamente não afetada. O fluxo de encaminhamento das amostras pode variar conforme a região, no entanto o LACEN é o responsável pelo encaminhamento das amostras para os laboratórios de referência regional (LRR) e nacional (LRN).

    A avaliação da epizootia deve ser realizada em conjunto com as diferentes esferas de gestão, e a vigilância vetorial deve ser acionada de forma concomitante à investigação das epizootias e dos casos humanos.

    As mudanças no perfil epidemiológico de transmissão do vírus demandam a organização e ampliação das ações integradas de vigilância, prevenção e controle, no sentido de se reduzir a incidência da doença e prevenir sua reurbanização no país (BRASIL, 2019).

    As medidas de prevenção e controle da febre amarela consistem em:

    • Manter a elevada cobertura vacinal em áreas de risco e infestadas por Aedes aegypti, considerando as áreas com recomendação de vacinação no país;
    • Orientar medidas de proteção individual para as pessoas que se expõem em áreas de risco;
    • Reduzir os índices de infestação vetorial do Aedes aegypti;
    • Isolar os casos suspeitos no período de viremia;
    • Implementar a vigilância laboratorial voltada para o diagnóstico diferencial;
    • Implementar a vigilância sanitária de portos, aeroportos e fronteiras.

    A partir de 2020, a vacinação contra a febre amarela (atenuada) foi ampliada em todo o Brasil, passando a ser recomendada nas ACRV, na população de 9 (nove) meses de vida a 59 anos de idade, com administração de uma dose de reforço para crianças de 4 anos de idade (BRASIL, 2021d).

    Para contextualizar o que já estudamos até aqui, nossa última seção abordará alguns exemplos de análises que devem ser realizadas pela vigilância.

    Você observa que os dados gerados pelas notificações, após sua inserção no SINAN, se transformam em informação?

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