Unidade 4 – Vigilância Ambiental e Controle das Arboviroses

Conforme vimos na seção anterior, os indicadores de saúde são instrumentos importantes para avaliar e monitorar os objetivos da Vigilância em Saúde Ambiental. A criação de indicadores parece inicialmente um método burocrático, mas não se engane! Indicadores permitem uma visão abrangente e integrada da situação de saúde e do ambiente ao mesmo tempo e permitem orientar as ações no território.

Os indicadores são utilizados como modelos simplificados da realidade que facilitam a compreensão de eventos, fenômenos ou percepções e aumentam a capacidade de comunicação de dados brutos e de adaptação das informações aos diferentes públicos interlocutores. Para os gestores, são ferramentas essenciais para o processo de tomada de decisão. Para a sociedade, são instrumentos importantes para o controle social. Não são elementos explicativos ou descritivos, mas informações pontuais no tempo e no espaço, cuja integração e evolução permitem o acompanhamento dinâmico da realidade (MAGALHÃES JÚNIOR, 2007).

Atualmente, há uma necessidade crescente de estruturar sistemas de monitoramento e vigilância que permitam antecipar e, na medida do possível, prevenir consequências negativas das mudanças ambientais na saúde das comunidades. Um dos grandes desafios para alcançar essa eficiência é a sistematização da coleta e análise de dados que permitam construir indicadores que apontem essa relação ambiente x homem (BRASIL, 2011b).

A PNVS define

análise de situação de saúde: ações de monitoramento contínuo da situação de saúde da população do País, Estado, Região, Município ou áreas de abrangência de equipes de atenção à saúde, por estudos e análises que identifiquem e expliquem problemas de saúde e o comportamento dos principais indicadores de saúde, contribuindo para um planejamento de saúde abrangente. (BRASIL, 2018).

Sistemas e instrumentos devem ser capazes de simplificar e disponibilizar oportunamente informações relevantes para que as ações e serviços do SUS sejam permanentemente aprimorados. Essa capacidade de facilitar a comunicação entre diferentes usuários (gestores, população e técnicos) é que torna os indicadores ferramentas essenciais nos processos de gestão, planejamento, monitoramento e avaliação.

Apontando o dedo para uma situação: o indicador!

Os indicadores transformam dados em informações relevantes para uma tomada de decisão mais próxima da realidade, da necessidade pública. Auxiliam a sintetizar o complexo conjunto de informações que abrangem a saúde, o meio ambiente e o nível de desenvolvimento de uma comunidade (VON SCHIRNDING, 2002). Eles oferecem informações para as políticas públicas; assinalam problemáticas e identificam tendências; promovem políticas específicas; e monitoram e avaliam avanços.

É urgente a estruturação de um sistema de indicadores para avaliar as condições ambientais. Apesar da fragilidade de alguns indicadores existentes (no sentido de fornecerem informações concretas sobre a qualidade do ambiente), a maior carência dos sistemas atuais é a de prover à sociedade instrumentos confiáveis que respaldem o planejamento, a execução e a avaliação da ação pública (CALIJURI et al., 2009).

Lembre-se de que o processo de construção de um sistema de indicadores ambientais é primordialmente interdisciplinar! Ele considera as condições ambientais, demográficas, comportamentais, culturais e socioeconômicas para uma concepção integrada do meio ambiente (HELLER; AZEVEDO, 2006).

Uma metodologia para análise dos indicadores de saúde ambiental é o modelo Força Motriz-Pressão-Estado/Situação-Exposição-Efeito-Ação (sigla FPEEEA ou FPSEEA), que foi desenvolvido pela OMS e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Esse modelo tem como pressuposto as complexas relações entre a saúde humana, o ambiente e o trabalho e visa propor ações de prevenção e mitigação dos problemas complexos que surgem dessas inter-relações. Foi desenvolvido com base na estrutura de um outro modelo, o Pressão-Estado-Resposta ou PER, em que P é a pressão exercida pelas atividades humanas sobre os recursos naturais e grupos populacionais indicadores de situação ou estado (S ou E) e R são as respostas específicas que garantem processos sustentáveis de desenvolvimento (ARAÚJO-PINTO; PERES; MOREIRA, 2012).

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O modelo FPEEEA/FPSEEA se baseia na construção de indicadores de vigilância ambiental das populações humanas, sistematizando alguns determinantes de saúde provenientes dos impactos de tecnologias ou processos no ambiente e na saúde humana (ARAÚJO-PINTO; PERES; MOREIRA, 2012). Vamos analisar alguns pontos desses indicadores, com alguns exemplos práticos:

  • Força motriz

    Corresponde aos fatores em escala macro dos vários processos que influenciam a saúde ambiental (taxa de urbanização e taxa de crescimento populacional);
  • Pressão

    Expressa pelas consequências dos processos citados (o consumo de energia derivado do aumento do crescimento populacional);
  • Situação ou estado

    O resultado da pressão no ambiente, geralmente um aumento na frequência ou magnitude de fenômenos ambientais que afetam a saúde (qualidade da água, do ar e do solo);
  • Exposição

    Um conceito-chave no modelo, pois estabelece as relações das situações ambientais e seus efeitos sobre o estado de saúde da comunidade e população. É resultado da pressão e força motriz;
  • Efeito

    Consequência da exposição na saúde humana e ambiental, que pode se manifestar de forma subclínica (redução da qualidade de vida na comunidade) ou como agravos (indicadores de morbimortalidade);
  • Ação

    Atitudes que gerenciam a tomada de decisão sobre os problemas sistematizados (STEDILE et al., 2018).

Vamos ver um exemplo de aplicação desse modelo? Utilizaremos, para contextualizar, uma análise da efetividade das ações de controle da dengue no município de Uberlândia-MG feita com o auxílio da matriz FPEEEA. Cada relação da cadeia de produção/efeito ambiental e humano pode ser caracterizado com indicadores que irão nortear as pressões, a situação do problema, a exposição e os efeitos nas comunidades humanas (ARANTES; PEREIRA, 2017).

Figura 15 - Modelo FPSEEA de construção de indicadores de saúde ambiental envolvendo o controle da dengue
adaptado de Arantes e Pereira (2017).

Nessa Figura, podemos perceber alguns indicadores relacionados à problemática dos resíduos. Esses indicadores foram organizados por tópico de acordo com o modelo FPSEEA em uma cadeia de eventos que culmina com efeitos negativos na comunidade. Em resposta a esses tópicos, ações são pensadas para mitigar ou bloquear os eventos deletérios antes dos efeitos cumulativos nos indivíduos. Trabalhador estudante, percebe como a solução de um problema crônico nos centros urbanos (acúmulo de lixo hospitalar) pode ser resolvido de forma estruturada? Fica muito mais fácil pensar um problema quando organizamos os passos que o geraram e trabalhamos em cima de cada um deles!

Vigilância Ambiental e fatores de risco biológico para arboviroses

A vigilância de fatores de risco biológico para arboviroses está relacionada com o controle ou a eliminação dos mosquitos vetores, principalmente. A seguir, explicitamos algumas arboviroses de maior preocupação epidemiológica no país, seus agentes transmissores (vetores) e os agentes etiológicos (causadores da doença).

Figura 16 - Esquema de vigilância de fatores biológicos
adaptado de Brasil (2002).

Entre as ações de controle de vetores no território, a vigilância em saúde deve atuar na identificação dos transmissores e dos criadouros dos vetores e nas rotas de transmissão da doença. Para exemplificar, trazemos duas ações da vigilância ambiental realizadas quando registrada suspeita de febre amarela em uma comunidade:

- Visitas domiciliares em áreas de borda (300 ou 400 metros a partir da mata) para realizar ações de comunicação e educação em saúde e manejo de criadouros envolvendo eliminação e/ou proteção e tratamento focal, quando necessário. Estas ações devem ser realizadas semanalmente com a participação da população e dos profissionais de saúde para interromper o ciclo do mosquito vetor (Aedes aegypti) na área urbana;

- Recomenda-se a aplicação de adulticida (inseticida que atua na forma adulta do mosquito) nas áreas de borda. Caso tenha equipamento e pessoal suficiente, o município deverá avaliar a possibilidade de aplicação intradomiciliar de inseticida nas residências vizinhas à mata.

Essas informações adicionais podem ser consultadas no Guia de Vigilância em Saúde (BRASIL, 2019b), material bastante rico disponível na Internet. Para mais detalhes sobre a vigilância e controle de vetores, consulte a Unidade 3 deste módulo!

Doenças como zika, chikungunya, dengue e febre amarela apresentam grande complexidade dentro do ambiente antrópico, tornando essencial repensar a estratégia de controle dessas doenças. O mecanismo da doença requer a adoção de políticas integradas entre diversos setores, e as ações de controle no território tornam-se mais efetivas com o mapeamento de áreas de risco.

Pode-se alcançar esse mapeamento utilizando a vigilância entomológica (priorizar locais que apresentam grande quantidade de criadouros de mosquitos vetores; levantamento rápido do índice de infestação predial), a vigilância epidemiológica (produzir dados sobre incidência e prevalência dessas doenças e do impacto das ações de controle), a interação com a rede de laboratórios de saúde pública e a inter-relação com ações de saneamento (MEDRONHO, 2006).

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